quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Resenha das peças lidas até Janeiro de 2009 (Plínio Marcos)

Navalha na Carne.

Escrita em 1967
“Um teatro de crueldade em estado bruto tal como encontramos na realidade”. “três pessoas se estraçalhando mutuamente por um “pico” de maconha, por um maço de notas amassado de michês, dentro de um espaço “ (sufoco).
É a história de Neuza Sueli, Wado e Veludo. Neuza é a prostituta que sustenta Wado, que é seu Gigolô. Os dois caem numa discussão ferrenha sobre o dinheiro que supostamente Neuza deixou pra Wado em cima da mesinha. Os dois concluem de que foi Veludo (que é quem arruma a zona do mocó) que pegou o dinheiro. Veludo é um homossexual que gosta de apanhar e assume que pegou o dinheiro para poder ficar com o menino que trabalha no bar. Com a querela resolvida com Veludo, Wado e Neuza brigam mais uma vez, ele vai embora, ela implora que ele volte e diz que vai estar esperando.

Anotações:
Wado destrói a auto estima de Neuza Sueli
Veludo assume o roubo
Wado vai embora.

Dois Perdidos numa noite Suja

Escrita em 1966
É a história de Paco e Tonho.
Os dois se encontram num mocó que dividem. Tonho estudou (esperança). Começa a acreditar que o sapato de Paco pode mudar sua vida. Tudo pelo “pisante”. Paco foi artista (tocava flauta). Paco maluco perigoso - as portas da violência para Tonho. Irritante. Chato mesmo, de verdade.
Os dois passam o tempo todo pela disputa do sapato de Paco... Até que Tonho se mete em confusão com o Negrão. O medo aperta Tonho que precisa mudar de vida rápido. Eles conseguem uma arma. Tonho planeja o primeiro assalto, Paco participa. Na divisão das divisas do roubo mais uma briga. Paco enche tanto a paciência de Tonho que o tira do sério. Ao final, Tonho se transforma em Tonho maluco perigoso ( o assassino de Paco).

Querô, uma Reportagem Maldita.

Escrita em 1976
Esta é a História de Querô, um menino de rua que foi ferido à bala num confronto com policias corruptos na boate da zona. Encontrado por um repórter, que ao ajudá-lo conseguiu seu depoimento e sua história. A peça não é contata numa cronologia linear. Querô era filho de mãe prostituta que o teve por querer um “precioso bem”. mas ao nascer Leda, tomou um vidro de querosene e deixou para que sua cafetina Violeta o criasse com a ajuda de Ju, sua amiga, que foi quem na verdade figurava como uma mãe para Querô. O tempo passa e Querô segue convivendo com a Malandragem.Tainha, chefe do gango, que entrega Querô pros policias porque ele é menor de idade, logo os policias corruptos da área percebem a existência dele, e exigem sua parte. Eles entram em conflito, Querô sai perdendo. O repórter é quem conta sua história.

Abajur Lilás

Escrita em 1969
Esta história se passa dentro do cafofo (prostíbulo) de Giro, no quarto das duas Dilma, a prostitua “conformada”, que está na viração por causa do filho e sonha em um dia sair dessa vida. Já Célia é a prostituta bêbada que não vê saída. Giro encontra um escarro com sangue na pia e vai tirar satisfação com Dilma, que joga a bola pra Célia, que também não assume. No meio dessa confusão Giro introduz mais uma puta no cafofo, Leninha é a mais nova e parece descolada. Logo o novo abajur lilás é quebrado e daí se segue com uma série de torturas para que as prostitutas entreguem quem quebrou os objetos do quarto. “Oswaldo acaba, a mando de Giro, torturando as três. Como ninguém entrega quem foi, Giro resolve descontar o custo do abajur do trabalho das prostitutas. Logo depois, Célia, com raiva, quebra mais alguns objetos no quarto. Nova sessão de tortura. Depois de longa sessão de tortura, Leninha acaba entregando que foi Célia que quebrou o abajur e outros objetos. Oswaldo atira e mata Célia. As outras duas prostitutas, chorando são obrigadas a se arrumarem para continuar o trabalho de prostitutas” .

Dilma - “conformada,” tem um filho.
Giro - cafetão gay - ex-travesti (de carnaval)
Célia - quer sair fora
Leninha - O novinha, descolada. Entrega Célia.
Osvaldo - Segurança burro e porradeiro.

A Balada de um Palhaço

Escrita em 1986
Bobo Plim e a cigana estão em lugar indeterminado, suas vidas se cruzam. Bobo Plin questiona-se... Entra o Menelão em cena. Começa disputa. Cada um com os seus valores... Um comercial (Menelão) e o outro artista (Bobo-Plim), em busca da sua alma, de seu Ideal. Acaba com Bobo Plin seguindo e Menelão se arrastando atrás.
“Ele nos apresenta personagens que são ainda o cáften e a prostituta de Navalha na carne, com a diferença de que a prostituta aqui tem outros sonhos. Menelão, cáften, quer “faturar”, mesmo que para isso se degrade com palhaçadas promocionais de uma loja na rua. Bobo Plin traz aspirações de alto vôo, quer ser mais que um palhaço sem alma condenado a repetir brincadeiras para um público sem cara. Quer ser um artista, um verdadeiro e sofrido artista. Eles sustentam posições tão antagônicas que tornam impossível o diálogo. Por isso não conversam; falam longamente, cada qual de seu lado. Bobo Plin é um solitário em proporções abissais: exerce sua arte para um público que é ninguém e está atado a um companheiro que não o acompanha. Surpreende-se aí um eco de Beckett reproduzido com a voz e o sotaque peculiares de Plínio Marcos. Havia o risco de cair no clichê do palhaço que faz rir enquanto derruba sua lágrima furtiva, mas o texto sabe colocar-se acima disso“.

O Bote da Loba

Escrita em 1997
O encontro de uma jovem sócia light reprimida e uma cigana lésbica reveladora. A sócia-light não sabe porque é deprimida, a cigana revela que está tudo na repressão sexual que ela precisa liberar, e que ela mesma (a cigana) poderia ser sua libertação. As duas acabam transando.

Quando as Máquinas Param

Escrita em 1967
Esta trata do casal Zé e Nina... Numa situação que deve se repetir em muitas famílias de baixa renda... Zé é um sem-ofício que está desempregado e obrigado a viver com a ajuda da sogra e dos amigos. Inconformado ele vai seguindo com o apoio de Nina. Alimentado por Nina e com a promessa de um emprego como taxista. Até que Nina dá a noticia de que está grávida. Ainda seguem acreditando, até Zé perceber que não terá dinheiro pra virar taxista... Isso vira o jogo, Zé perde todas as esperanças e na exigência de que Nina se livre daquele filho mete-lhe a porrada, e ao final se arrepende pedindo uma ambulância.

Oração para um Pé-de-Chinelo

Escrita em 1969
Esta é história de Bereco, um malandro prometido de morte pelos homens. Bereco tenta esconderijo no cafofo de Rato, um alcoólatra, tuberculoso que tem como companheira Dilma, um prostituta também sem ter onde cair morta. Rato recebe Bereco e de tanto Dilma escrotizar o Pé de chinelo (Bereco) este se invoca e acaba envolvendo Rato e Dilma na tensão da espera pelos canas que podem chegar a qualquer momento. Enquanto esperam fica a discussão de quem sai pra comprar comida e pinga- para o Rato. Finalmente, Bereco decide confiar em Dilma, da-lhe a grana ela sai e não volta mais. Ficam Rato (seco pela pinga) e Bereco esperando a policia. Que quando chega mata Rato que sai se entregando e mesmo sem dever nada é apagado e depois sugere-se que Bereco também foi presa dos canas.
Madame Blavatsky
Escrita em 1985
História em tom bibliográfico da vida desta jovem que se casou cedo, traumatizou-se com o marido (bode) mais velho de pau grande. Sempre com a imagem da mãe que lhe colocou na cabeça idéias à frente do seu tempo sobre a condição feminina. Depois do casamento, partiu para índia, onde um faquir a ensinou a controlar seu dom de clarividência. Em sua trajetória ela enfrentou seus monstros e curou pessoas. Viajou mundo e retornou pra Londres onde deu entrevistas e conheceu Anne, uma companheira que a acompanhou o resto de sua vida, inclusive na fundação de sua instituição teosófica ao lado do coronel Olcott, sendo “perseguida” pela Sociedade Inglesa de Pesquisas Psíquicas, sempre gerando controvérsias e polemica. Ao final, depois de “matar” seus fantasmas, inclusive o seu “Mestre”, helena se deixa morrer ao lado de Anne. A peça termina com diversas personalidades declarando as influências de Madame Blavatsky.
Homens de Papel
Escrita em 1968
É uma peça de muitos personagens... Todos catadores de papel e um “chefe” que é o Berrão, que é chefe porque anda armado. De inicio os catadores trazem a cata do dia pra ser pesada por Berrão e receberem por isso. Berrão sempre altera o peso e às vezes leva uma das mulheres para “conferir” o peso da carga... Principalmente Maria-Vai que é mulher de Tião. Chicão é um dos catadores que começa uma conspiração contra Berrão, incutindo idéias na cabeça de Tião, sugerindo uma espécie de “greve”, mas não assumindo que ele é o cabeça. Nesta primeira pesagem todos comentam que foi pouco porque parecia que alguém já tinha feito a cata antes, no final deste dia chegam os retardatários com novas figuras - Nham Nham, Frido e Gá - uma família com uma criança que dizem precisar de um Doutor para tratar seus “ataques”, foram eles que cataram antes dos miseráveis. Coco, um dos catadores, se encanta por Gá, mas a principio só a mima com uma boneca quebrada.Um dia se passa, o conflito maior se estabelece quando Frido começa a beber e a apoiar a tal “greve” proposta por Tião/Chicão. Nham Nham insiste que precisam do dinheiro pro tratamento de Gá. Finalmente impõem a sua vontade, mas deixam Gá sozinha para irem trabalhar, todos acabam indo trabalhar também. Coco pega Gá sozinha... Ao tentar estuprá-la ela tem um ataque e ele, em desespero, acaba matando-a. Ao voltarem do trabalho os outros percebem o que aconteceu e incitados por Nham Nham acabam com a vida de Coco... Quando Berrão aparece também é pressionado por Nham Nham e acaba dando-lhe o dinheiro pro enterro da menina. Ao final, mesmo depois de um vislumbre de possibilidade de insurreição dos miseráveis, tudo acaba como era antes, eles colocando o que cataram no caminhão.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Análise pessoal do processo - por Fernando Lopes

Faz um pouco mais de um mês que conversei pela primeira vez com a Dora e a Luciana sobre a vontade de montar um peça de rua. Falei sobre os dez anos da morte de Plínio Marcos e como seria interessante pesquisar sua vida e obra para construção de um novo texto, livremente inspirado. Inicialmente seria uma pesquisa sobre as mulheres na obra de Plínio. O titlulo do projeto era "Mulheres de Plínio". Queria trabalhar só com mulheres, talvez, pelo fato, de ter entrando no universo feminino nas minhas ultimas montagens, sentia que este assunto ainda não havia se esgotado em mim. Quando começamos a pensar em fazer isso juntos, percebi que a Luciana e a Dora precisavam participar do processo de escolha do tema. Dai decidimos juntos que seria uma pesquisa sem foco. O que todos concordavam é que tinha de manter a temática retirada da obra de Plínio Marcos, uma antropofagia (PlínioMarcofagia).
Neste meio tempo fiz uma campanha entre os amigos e consegui junto a Ong Pra Sempre a quantia de Cinco Mil Reais, não é muito dinheiro mas vai facilitar em muito a produção.
Demos início aos trabalhos. Comecei a convidar possíveis parceiros para formar uma equipe de colaboradores. Pensei primeiro na Maíra Cesarino, pois sabia que o mestrado dela em Capoeira para o ator iria contribuir com nosso processo de pesquisa. Não demorou muito para descobrirmos a capoeira na linguagem "Malandra" de Plínio Marcos. Depois convidei a Gyu Duarte para dar uma oficina de palhaço, neste caso, sabia da ligação do autor com o universo do palhaço de circo, é possível reconhecer nas personagens das peças do nosso autor homenageado a figura do palhaço, do bufão. Certamente pelo fato dele mesmo ter sido palhaço de circo.

Após estas três semanas de trabalho posso afirmar que todas as escolhas feitas foram acertadas, a produção (eu) está de parabéns. Já podemos desenhar um espetáculo de possibilidades.

Comecei a procurar outros parceiros. Em uma festa encontrei o Moacir Prudêncio, em pouco tempo de conversa pude perceber, com meu faro para talentos, que estava diante de um possível colaborador. Sem cerimonia fiz o convite e ele de pronto aceitou. Na ultima Segunda-feira (08/12) fizemos o primeiro encontro na rua com o Moacir. Antes ele tinha vindo aqui em casa, com textos e um vídeo para um troca de ideia sobre a seu Work Shopping e como ele poderia contribuir. Agora nós fomos para a rua da início aos trabalhos com este jovem brilhante, apaixonado, curioso, artista. Moacir se soma ao trabalho com muita propriedade.

Aos poucos nossa equipe vai ganhando forma, se compreendendo e compreendendo o trabalho. No meio disto tudo estou encarregado de levar e trazer informações, cruzando as experiências.

Agora na Quinta-feira vamos começar o trabalho de voz com a Kátia Kouto. Belo Horizonte é incrível, só precisei convidar a Kátia e ele se mostrou muito interessada em fazer parte, não há duvidas de sua competência e te-la conosco é uma honra desmedida. Ela já teve a oportunidade de conhecer a potente vozes das duas atrizes e sabe o que deve trabalhar para encorpar ainda mais as vozes das duas.
A equipe ainda contou com uma única aula de percussão da Milagros que, apesar de ter sido um rápido encontro, nos fez enlouquecer com o ritmo, pulsação e as possibilidades da percussão. Vamos tentar dar continuidade a este trabalho, vai depender do tempo (agenda) da Milagros.

Temos ainda o Fernando Muzzi que vai fazer a direção musical. Ele está aguardando o momento certo para entrar no trabalho. Ter o Muzzi em um processo de montagem é contar com suas experiência e talento premiado.

Não posso deixar de falar do trabalho dobrado que a Dora Sá está desempenhado. Além de atuar ela é a responsável por transformar nossos esforços em dramaturgia. Sua dedicação tem dado resultado e já aponta caminhos. Juntas, a Dora e a Lu (Luciana Bahia), formam uma perfeita dupla, são talentosas, experientes e dedicadas. O trabalho do diretor é facilitado quando lida com tantos talentos e vocações. Minha única preocupação é se vou dar conta de administrar tudo que estamos produzindo.

São apenas três semanas de trabalho e no momento tudo caminha com o cuidado necessário para uma criação artística. No final de tudo é isto que importa, a obra de arte que pulsa, viva, latente e a flor da pele comunica.

Somos poetas, filósofos e cientistas. Tudo que estamos vivendo, no momento da apresentação deve atravessar a plateia, uma explosão de poesia.

Nestes dias de trabalho, pudemos sentir o gostinho, o paladar de uma processo de montagem. Foram poucos dias profundos, quase indizível, se não fosse o fato de ser dizível. As vezes sou muito racional. preciso transformar tudo em algo que se possa pegar, agarrar, sentir, cheirar, saborear. Me sinto obrigado a guardar. Se isso não for uma prisão pode ser muito útil, no caso da criação de um produto final.

Acredito na trajetória, no ritual magico dos acontecimentos aleatórios. Desde o inicio sei onde quero chegar. Parece estranho em se tratando de um criação colaborativa. De alguma maneira me norteio pelo o indicador de um bússola quebrada que sempre aponta a direção certa. Neste raciocínio vou me agarrando aos encontros dos "bem chegados". Ontem (08/12), conversando com o Moacir, percebi que a equipe está toda antenada. Tenho a impressão que as atualizações do Diário de Bordo e as informações que passo, surtiram o efeito esperado. Tenho feito um diário de bordo e envio atualizado toda semana, mantendo todos antenados no processo. Fora que despejei no meu orkut uma variedade de imagens que são inspirações para o processo.

Vale ressaltar o papel da Internet no nosso trabalho. As informações trocadas via orkut, MSN, blog e e-mail estão sendo determinantes. Fora, a possibilidade do envio de arquivos como, fotos e mensagens, tenho encontrando pessoas, gente virtual e virtuosa que interferem diretamente, como é o caso do artista Fernando Lomardo, que depois de algumas ideias trocadas sobre cenário em uma comunidade no orkut, me enviou desenhos de cenários que me ajudaram a ver o espaço estético que estava só no pensamento.



Pensar estética antes mesmo de se ter uma peça é perigoso, se não tomar o devido cuidado pode ser um fator limitador. Mas este desafio me atrai, no sentido do espaços e suas possibilidades. Por isso estou propondo e pensando imagens que inspirão a criação de uma historia ou muitas historias. Sabemos do retrato que Plínio Marcos descreve e dentro deste, ou a partir deste recorte é que vamos buscar os elementos, os objetos, a estética. Nossa construção passa pelo Plínio, pensa e cria imagens, recorta a cidade, cria cartão postais, vive o encontro do palhaço, caminha para o bufão, constroi um corpo novo, fortalece a voz, visualiza o teatro de rua, suas possibilidades e limitações, questiona a própria existência e se agarra as possibilidades. Tudo isso para criar a imagem das imagens, imagem movimento, imagem viva, imagem corpo e afecção, Uma maneira legitima de criar a si mesmo, este novo ser quer comunicar, quer encontrar. Daí o texto vem vindo com a força da necessidade.
Somente no encontro, em relação, há transformação, criação. Tenho certeza que os encontros que houveram desde o início do trabalho já nos transforma a todos. Mesmo que eu saiba onde chegar, sou apenas um passageiro, um colecionador de sensações, um observador atento, sem pressa de chegar no óbvio, o grande final.
O fim é o início, acredito no circulo infinitamente infinito.
Não sei se consegui ser claro nesta analise pessoal dos momentos de criação da peça "As Quebradas do Grande Circo Mundaréu" - Sigamos dai para adiante.
Feliz 2009 para todos!